08/12/2011
às 19:48 \ Consultório“É O dengue ou A dengue, afinal?” (Thaís M. Dutra)
Consulta curta e boa, Thaís. Dengue, a doença infecciosa, costumava ter gênero feminino exclusivo, muitos anos atrás, mas os brasileiros têm se acostumado com a ideia de que é uma palavra transexual, aqui feminina e logo adiante masculina. Não se trata exatamente de “tanto faz”. Por exemplo: para dicionários como o Houaiss e o da Academia das Ciências de Lisboa, a dengue é fêmea e ponto final; para o popular Aurélio, o dengue é macho – e não se fala mais nisso. Na soma temos um substantivo de dois gêneros, mas para cada uma das partes o caráter ambíguo da palavra permanece no armário.
Dengue é uma palavra do início do século 19 que tem duas acepções básicas: faceirice, manha, charme feminino; e moléstia infecciosa. No primeiro caso é inquestionavelmente masculina, o dengue ou dengo (ainda que se refira a algo mais valorizado na mulher que no homem, a denguice). O sentido de doença, que tudo indica ser posterior, altera ou não – eis a questão – o gênero da palavra, dependendo do dicionário que você consultar e do jornal que você ler.
O gênero não é a única indefinição. Na etimologia também não há consenso: dengue pode ter vindo do espanhol dengue (que ninguém sabe de onde teria vindo) ou ter origem africana, o quimbundo ndenge (“recém-nascido, criança que faz manha”). Há até um dicionário, o Michaelis, que prefere tratar dengue e dengue como duas palavras absolutamente distintas: se é dengo, é menino e africano; se é caso médico, menina e espanhola.
Há algo de reconfortante num esquema tão simples, mas ele deixa de levar em conta que já no espanhol do século 18 o vocábulo dengue queria dizer “melindre, trejeitos afetados” – sentido que possivelmente esteve, por metonímia, na raiz do nome da doença, em referência à prostração das vítimas.
Em casos como esse, vale a regra clássica: cada falante decide o seu caminho. Eu decidi o meu. Para mim, a doença sempre foi e continuará sendo a dengue.
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