Meu Cantinho
Saudade do “Coronel Venâncio”
Mauro Adorno
Minha casa, na Rua Ministro Cunha Canto, distava mais ou menos 300 metros do Grupo Escolar “Coronel Venâncio”, uma escola de ótimo nível, com professores dedicados que, além de educadores, participavam de nossas vidas como se fossem nossos pais. Era outra época. Eles tinham a liberdade e o direito de colocar de castigo e dar até aquela palmada benfazeja. E não eram somente eles que exercitavam o poder de polícia para conosco – existiam também os inspetores de alunos que eram respeitados e conseguiam se impor junto aos estudantes. Maria Joana Tavares foi uma dessas figuras. Enérgica, era temida, mas sempre elogiada pelos pais de alunos por “cuidar” muito bem de seus filhos.
Minha ligação com o “Coronel Venâncio” antecede à matrícula do primeiro ano primário. Três de minhas irmãs estudavam lá e eu as admirava, saindo com saias xadrez e blusas brancas, com os cadernos, o livro “Caminho Suave”, e caixas de lápis de cor, com desenho de pinheiro. Uma das lembranças dessa época foi a incumbência de minha mãe de um dia levar o lanche às minhas irmãs. Eram mais ou menos 13 horas e eu estava ansioso: queria sair e adentrar naquele prédio bonito e imponente. Com a insistência própria de uma criança, minha mãe disse: “quando o ponteiro pequeno chegar ao número 2, e o grande no 24, (14 horas) você vai”. Fiquei ali, sentado em frente ao relógio, contando os segundos.
No primeiro dia de aula, aquela insegurança, o temor pelo desconhecido, especialmente por ter que relacionar com outros meninos até então desconhecidos. Com sorriso, como era peculiar em sua pessoa, seu Ariovaldo me deu as boas vindas e me ensinou onde seria minha classe, cuja mestra seria a professora Angélica Carneiro. E foi justamente com ela que passei um dos maiores constrangimentos de minha vida. Um dia estávamos na lousa, eu e o Pelezinho – não recordo mais seu nome – e dona Angélica, nós virados para a classe e ela ao quadro negro. Não lembro o que ele disse que fez com que ela armasse um tapa. Ágil, ele abaixou e eu levei, sem mais nem menos, um tapa na face direita. Dona Angélica pediu mil desculpas e eu fiquei vermelho como tomate.
Nomes memoráveis do magistério passaram pela escola. Muitos de vocês leitores devem estar trazendo à mente seus primeiros mestres. Tive o prazer de ter aulas com Emengarda Gomes, Paulo Crozera Camargo e a enérgica Lourdes Xavier. E conviver com o diretor Constantino Alves. Naquela época já existia a merenda escolar, substanciosa e de ótimo sabor, pela vaga lembrança. Era sopa de macarrão com feijão ou de fubá com cambuquira e, invariavelmente sagu ou canjica. A tristeza e mágoa que sinto são grandes, pelo fato de terem descaracterizado em grande parte a arquitetura original do prédio.
O tempo passa, mas as lembranças ficam. Dentre elas, aquela famosa foto de final de ano, tirada na sala de aula, com um mapa do mundo ao fundo. Muitos devem tê-las naquele baú de relíquia que guardamos para um dia mostrar aos nossos filhos e netos. Coronel Venâncio, um ilustre colaborador com as causas da cidade teve seu nome perpetuado no estabelecimento. Seu nome era Venâncio Ferreira Alves Adorno, avô do Toninho Ferreira Alves, ex-prefeito da cidade, na administração de meu amigo, Ricardo Brandão. Era meu parente também, de longe, mas era.
Mauro de Campos Adorno Filho é jornalista
e ex-diretor dos jornais O Impacto e Gazeta Guaçuana.
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